No instante que aprendi a ler e escrever, eu soube com clareza o que eu queria ser para o resto de minha vida, eu só não imaginava que existia uma definição, um nome, só mais tarde fui descobrir que era...
Escritor, uma palavra pequena, no entanto, com vários significados.
Quando eu completei onze anos eu mostrei para minha mãe minha primeira criação, que continha em um caderno um manuscrito de uma peça teatral que eu criei. O que estava me deixando mais alucinado era que os professores aprovaram minha ideia e a peça ia acontecer.
Meus olhos faltavam soltar de minhas órbitas quando eu afirmei diante de minha mãe tal frase:
"Mãe, eu quero viver de letras."
Logicamente, minha mãe achou a expressão um pouco estranha, mas diante da minha felicidade e da minha empolgação ela entendeu o que eu quis dizer. Com a voz um pouco embargada pela emoção ela declarou:
"Você nunca vai se arrepender por viver seus sonhos, querido."
Lembro-me do seu abraço caloroso e dos eu estou orgulhosa que ela sussurrou no meu ouvido incansavelmente, talvez seja justamente por conta disso que estou aqui agora, com os meus vinte anos, diante de um homem que além de ser um exemplo de professor, se tornou, acima de tudo, um grande amigo.
Agora, em suas mãos enrugadas, ele segura uma folha simples de papel contendo algumas linhas tortas rabiscadas, são apenas alguns pensamentos que eu quis anotar depois de alguns dias que eu tentei uma possível aproximação com o Harry.
Após o acontecido no pátio eu nunca mais o vi pelos corredores, e muito menos no gramado fumando, é como se ele tivesse existido apenas nos meus pensamentos.
Estou batucando os dedos nervosamente na coxa quando ouço Henry suspirar baixinho deixando seus óculos repousar em sua mesa ao lado. Silêncio. Estamos sozinhos, é final do dia, todos os alunos já foram embora, mas eu não. Simplesmente não consigo controlar a ansiedade de conversar com Henry, eu preciso compartilhar isso com alguém e não existe ninguém melhor que ele.
–Você está apaixonado, filho? - é a primeira pergunta que sai de sua boca, eu confesso que precisei de alguns segundos para me recompor, sinto-me totalmente envergonhado porque sei., completamente, como minha expressão facial me entrega.
–São apenas alguns pensamentos que eu tive durante uma madrugada qualquer- dei de ombros tentando ao máximo soar indiferente.
–Por ser apenas pensamentos você está bastante inspirado- um sorriso maroto escapa de seus lábios, tento não sorrir com isso, mas eu me sinto tão à vontade com Henry que é tudo tão natural.
–Depois de assistir muitos filmes de romance sozinho você aprende a ser romântico.
–Bom argumento, meu rapaz. -Henry me lança uma piscadela com humor, logo depois guarda meus rascunhos em sua pasta pessoal– Se não se importa eu vou ficar com os seus pensamentos "qualquer" que você teve misteriosamente na madrugada, tudo bem?
Henry não existe! Pressiono os lábios para não rir e ele não faz questão nenhuma de soltar um riso genuíno de toda a situação.
–Você é o caos Henry.- não aguentei e comecei a rir junto com ele, instante depois nosso riso cessou e ficamos nos olhando por alguns segundos antes de eu dizer:–Você sabe que eu nunca vou conseguir lhe agradecer o suficiente, não sabe?
–Do que está falando, filho?
–De tudo, Henry, tudo.
Com isso o puxo para um abraço caloroso e acolhedor, porque eu sei o que ele pretende fazer com o meu rascunho, ele está me dando mais uma oportunidade de realizar mais um grande sonho! Um dia ele me disse que publicaria um livro de minha autoria, desde então eu venho buscando fontes de inspirações. Obviamente escrevi diversos rascunhos, mas nenhum ficava aprazível para apresentar a Henry, até que Harry surgiu e com ele veio a inspiração que me faltava. Hoje, eu sei que dei um grande passo, e sei o quanto isso significa para mim e para Henry que está acreditando tanto em mim e no meu trabalho.
–Você é merecedor de tudo o que acontece em sua vida, Louis, portanto, não agrade a mim, mas a você mesmo! - Henry sussurra olhando fixamente em meus olhos marejados, ele só desvia os olhos após eu concordar. -Muito bem garoto, agora leia este livro até sexta feira e me faça um resumo até segunda.
E lá estava o Henry, meu querido professor de letras. Pego o pesadíssimo livro que ele me entrega e o encaro por alguns instantes não querendo ir embora sem perguntar dele.
–Henry? -o chamo.
–Sim? - – noto que ele já terminou de pegar seus pertences, ele já está com a pasta no ombro fazendo menção para ir embora quando eu o chamo.
–Aonde eu posso encontrá-lo? -pergunto baixo demais, Henry franze a testa em confusão, então caminho mais perto e repito novamente a pergunta.
–Quem você está se referindo, meu jovem? -meu coração parece que vai explodir.
–Me refiro ao garoto que o senhor disse que trabalha aqui...
–Hum, o garoto misterioso e de poucas palavras? - assinto em concordância- Bom, eu nunca procurei saber, mas eu já o vi algumas vezes saindo de uma pequena cabana próximo ao estábulo.
–Onde os alunos que cursam veterinária ficam...-penso em voz alta comigo mesmo entrando em um pequeno transe.
–Louis? -Henry me traz de volta a realidade me chamando com a voz um pouco alta. - Harry é um garoto maravilhoso, mas ele está cheio de feridas também, não precisa de muito convívio para perceber.
–Obrigado, Henry. -lhe dou um ligeiro abraço de despedida e aproveito para sair de vez da sala.
Okay, agora eu sei onde eu possivelmente posso encontrá-lo. Minhas mãos suam porque, caramba, eu preciso trabalhar hoje, mas eu não vou embora de jeito nenhum sabendo que eu posso vê-lo mais uma vez. Jerry vai me matar, mas meu corpo não me obedece, eu faço movimentos automáticos, guardo o livro que preciso ler na mochila e sigo meu caminho como se estive quase em desespero.
Saio do Campus de onde os alunos de letras cursam e desço imediatamente a estrada íngreme que me leva até os cavalos.
Lá embaixo é praticamente uma fazendinha, ao me aproximar um pouco mais, eu percebo com alegria como alguns animais andam livremente pelo gramado e, de repente, me sinto um verdadeiro idiota por quase nunca ter vindo aqui desfrutar-me dessa dádiva maravilhosa.
Ao lado da fazendinha está o estábulo, os cavalos estão dormindo e são todos lindos e mansos, tenho vontade de entrar e acariciá-los, mas me seguro quando meus olhos caem para uma pequena armação com lonas existente poucos metros depois.
A cabana a que Henry se referiu.
Sinto o coração gelar por alguns instantes, eu não quero acreditar no pensando que ronda minha cabeça neste momento, porém, não tenho tempo de me recuperar, pois ouço uma voz rouca soar ao longe, como se alguém estivesse dando comandos e ordens.
Mesmo trocando poucas palavras com Harry eu consigo reconhecer que é sua voz, então sou rápido em correr para me esconder no estábulo, mas para o meu horror eu acabo tropeçando em um enorme pacote de ração e, quando vejo, já estou com a cara no chão, percebo instantes depois que a minha queda foi o suficiente para acordar dois cavalos.
Tento fazer alguns gestos para eles se acalmarem, mas seja o que for que eu esteja fazendo, só está piorando, eles estão ficando mais agitados e para meu desespero eles começam a relinchar.
Respiro fundo e crio coragem para espiar o lado de fora, logo me arrependo, pois o que eu vejo simplesmente faz meu coração falhar uma batida, é nada mais, nada menos que a figura magnífica de Harry subindo a estradinha cantarolando uma música distraidamente vestido com uma calça jeans que está moldando perfeitamente seu corpo, subo meu olhar e me derreto ao vê-lo com camisa de botões, principalmente porque alguns estão abertos propositalmente, e seus cachos agora estão domados por uma bandana, pela primeira vez, eu tenho contato direto com Harry e caramba, como ele consegue a proeza de se superar cada vez mais?
Parece que ele caminha em câmera lenta e por alguns instantes eu me esqueço completamente de onde estou, é só ele que eu consigo olhar, é só ele que meus olhos seguem. Eu só consigo voltar a realidade quando sinto uma dor imensa na lateral do rosto esquerdo, alguns segundos depois vejo a porta do estábulo diante do meu nariz e volto para a realidade rapidamente. Ele entrou, puta merda.
–Oi, amigão, percebo que está agitado hoje. -Harry cumprimenta gentilemente o primeiro cavalo e faz um carinho em seu pescoço, o animal abaixa a cabeça parecendo fechar os olhos de satisfação. -Calma, Pé de Pano, eu já chego aí.
Harry exclamou para outro cavalo que ao vê-lo dando atenção para seu colega se sentiu enciumado, mas confesso que eu juntei todas as forças para pressionar os lábios e não soltar um riso auditivo.
Pé de pano é um ótimo nome, com certeza marcarei no meu caderninho mental de: os melhores nomes de animais.
Fico os próximos minutos apenas admirando o jeito meigo que Harry cuida dos cavalos, eu posso sentir o tanto de amor que ele exala ao dizer cada palavra de carinho a eles, é como se eles fossem algo a mais para Harry, eles têm uma conexão genuinamente verdadeira e particular.
Fico abobado admirando a beleza do garoto a minha frente; sua bota combina com a fivela de seu cinto, ele é detalhista. Harry também gosta muito de pulseiras e anéis, noto alguns enfeitando seus dedos longos e finos, percebo também que ele morde os lábios involuntariamente quando está concentrado em uma tarefa, como está agora, limpando onde os animais ficam, Harry tem a voz maravilhosa... ele volta a cantarolar a canção e eu me remexo para tentar me concentrar em outras coisas, mas é impossível quando o que eu tenho na minha frente é espetacular e alucinantes.
No entanto, sou tirado drasticamente de seu encanto quando meu celular começa a tocar no meu bolso traseiro, amaldiçoei -me mentalmente por ter esquecido de pôr no silencioso, mas sem ter o que fazer, me rendo e caminho para fora do meu esconderijo totalmente desconcertado.
Por sorte tenho uma razão para não o olhar diretamente nos olhos, com isso ganho um pouco de tempo para me recompor do constrangimento, aproveito para recusar a ligação de Niall, porém, assim que eu nego sua ligação, uma mensagem surge na minha tela.
"Você está fodido se não vir trabalhar hoje Tomlinson."
Merda. Esqueci completamente. Suspiro guardando o aparelho na mochila.
–Você está me seguindo? - É a primeira coisa que Harry pergunta ao cruzar seus braços na altura do peito. Seu semblante que antes era tão leve, solto e radiante, agora é totalmente fechado e sombrio.
–Eu estava apenas passando por aqui e resolvi visitar os cavalos, preciso de permissão? - Ergo levemente uma sobrancelha, luto para um sorriso não escapar de meus lábios.
–Na verdade, precisa sim, eu posso ver sua permissão? - Ele descruza os braços só para esticá-los para mim. Meus olhos me traem, mesmo eu lutando para me controlar, eu não consigo, meu corpo é meu pior inimigo, pois eu me pego admirando cada pedacinho de sua pele exposta.
Sua pele parece tão macia, sua mão tão delicada... Por alguns instantes de pura loucura eu toco em seus dedos estendidos.
–Ficou maluco? Eu só estou pedindo para ver sua autorização para estar nesta área! - ele deu um passo para trás e novamente deixou claro a distância entre nós.
–Tudo bem, você me pegou, -baixei os ombros em derrota, fiz minha melhor expressão de tristeza que quase arrancou um sorriso de Harry- Eu estava aqui o tempo todo apenas para te esperar! Você descobriu o meu segredo, e agora o que vai fazer? - Arregalei os olhos dramaticamente, o fitei por cima dos cílios com a testa franzida e a sobrancelhas arqueadas. Harry se remexeu com a mudança repentina da conversa, ele parece hesitar por algum momento.
–Além de gostar de se esconder, você também gosta de bancar o engraçadinho? -Harry está claramente irritado, ele deixa isso bem óbvio quando solta um suspiro longo e pesado.
–Eu também gosto de escrever. - completo timidamente.
–Ótimo, muito bom, mas eu não tenho tempo para ficar aqui jogando conversa fora com você.
O garoto se vira e começa a colocar ração para os cavalos, vejo como ele é ágil e habilidoso... cada segundo durante seu trabalho eu aproveito para admirá-lo, admiro a forma como ele pega o saco da ração com facilidade, seus músculos ressaltam quando ele se levanta para alcançar o recipiente onde tem que depositar o alimento.
Sua camisa se ergue alguns centímetros, somente o suficiente para eu conseguir notar uma tatuagem em sua virilha, instigante.
O cacheado é ligeiro, não é nenhuma surpresa quando, em poucos minutos, ele já está do lado de fora do estábulo com as mãos na porta me esperando sair.
–Eu ainda preciso alimentar os coelhos, senhor...-percebo como suas bochechas ficam vermelhas, se ele soubesse como fica adorável assim...
–Por favor, me chame de Louis. -digo caminhando em sua direção. Quando Harry terminou de trancar as portas de madeira eu segurei seus pulsos delicadamente antes dele partir. - E a propósito, eu posso arriscar minha vida perguntando o seu nome?
Os olhos verdes esmeralda de Harry recaem imediatamente sobre meus dedos em seu pulso, por alguns instantes prendo a respiração e quando volto a olhá-lo me surpreendo por constatar que ele também me olha intensamente.
–Eu não faria isso se fosse você. - sua voz não passa de um sussurro quente ameaçador e, num piscar de olhos, ele se livra de minha mão e segue seu caminho sem olhar para trás.
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